quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

ERA 7

De quando a quando ia tomando atenção á cana. Por vezes, olhar para a cana com o era como olhar para o céu. O “starlight” assemelhava-se a uma estrela no horizonte, talvez se pedisse um desejo se realizasse. Geralmente peço “felicidade”, peço a Deus ou a um qualquer deus supremo que vagueie pelo céu que nos possa conceder algum desejo. Porto-me bem o ano inteiro, peço os desejos no natal, peço também no ano novo, no aniversário e nada. Para vos dar um exemplo: uma outra ocasião não tinha dinheiro e consegui vender um robalito de algum peso, valeu-me uma nota cujo objetivo seria para me aguentar o resto do mês até receber o vencimento, mas um pobrezito vasculhava os caixotes do lixo por comida, a sua fome sem vergonha fazia-o humilhar-se naquelas caixas castanhas. Ao vê-lo magro tive complacência e dei-lhe a nota. Que porra, pensei eu. Também é só dinheiro, nem estou muito precisado e faltam só três dias para o dia de São Receber, não era uma coisa que me valesse muito desde que tivesse algum para as coisinhas. Afastando a quantidade, muito ou pouco, se não tivermos ninguém para partilhar de que interessa ter dinheiro.
Pensei que essa atitude ficasse bem aos olhos do Salvador mas de pouco me valeu. Pois como disse: não o dei para ficar bem visto aos olhos de ninguém, mas podia significar algo e nem a mim, apesar de me deixar a consciência tranquila de que aquele moço sobreviveria mais uns dias, não me trouxe felicidade. Oh mal fadado destino: talvez se me tivesses dado ignorância, fosse agora um homem casado e com filhos; uma casinha e um trabalho, e talvez fosse feliz embora estupidamente estúpido. O pai dizia que eu era inteligente mas sempre lhe respondi que era uma maldição dir-lhe-ia agora isso se ele cá estivesse. Lembrei-me da cana, observei-a e ela ainda vibrava. Enquanto estiver a vibrar é bom sinal, quer dizer que ainda há lá isca no anzol e eles andam a cheirar e a picar a minhoca tentando a sorte. É esperar, deduzi eu.

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